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O Enigma da Natureza: Entre Bichos e Humanos

 

Sempre me intrigou a forma como encaramos a adoção de um animal. Há uma expectativa quase infantil, uma projeção de que aquele ser peludo ou emplumado será uma espécie de "criança" em quatro patas. Acreditamos, com uma ingenuidade beirando o otimismo cego, que com um pouco de adestramento, ele alcançará o mesmo tipo de raciocínio e comportamento de um filho humano. Um engano capaz de custar caro a muitos corações e, tristemente, a muitas vidas animais.

 

Por essa visão distorcida, os abrigos vivem lotados e as ruas, abarrotadas de olhares famintos. Ao primeiro sapato mastigado, aos móveis arranhados com um desdém quase artístico, àquela blusa favorita que se transforma em retalhos roídos, a desilusão se instala. Sem contar os concertos noturnos de latidos e miados altissonantes, ou nos objetos  despencando misteriosamente, empurrados por patas curiosas.

Não, meu caro, você não adotou uma criança. Você adotou um animal. Um pet, se preferir, mas ainda assim um ser com uma natureza intrínseca, lógicas e raciocínios que, acredite, apesar das semelhanças há inúmeros aspectos distintos dos nossos.

 

Eles são bonitinhos, sabemos. Mas ser “bonitinho” não é tudo, e essa máxima, curiosamente, se aplica também a nós, humanos. Meu envolvimento com animais, desde que decidi abrir as portas da minha casa para eles, foi uma escola.

Uma escola que me ensinou que a natureza, por mais que tentemos moldá-la, em algum momento retorna à sua raiz mais profunda. É aí que as questões atávicas emergem, aquelas da linhagem, do sangue, da essência do indivíduo. Isso vale para os ditos irracionais e para nós, humanos, que nos vangloriamos de nossa racionalidade.

 

Veja bem, um animal com instinto predador será sempre um predador em potencial. Não importa se ele está farto, se nunca pegou uma presa na vida. Correrá sim, atrás de um roedor imaginário ou de uma bolinha. É da sua natureza. E contra ela, ninguém pode lutar, nem mesmo contra a própria.

 

Essa verdade profunda se estende para dentro de nós. Quantas vezes questões internas, ansiedades, claustrofobias, nos afligem sem  compreendermos a origem? Olha  a genética se impondo! A mistura de pais, avós, bisavós, um emaranhado de influências carregando um peso imenso. Quando a alma se sentir turva, devemos olhar para nossos ancestrais, para nossos parentes! Muitas respostas  estão lá, no DNA que tece a nossa existência.

 

E a traição? Temos uma tendência a pensar que, por sermos bons, por termos ajudado, por não fazermos mal a ninguém, os outros retribuirão na mesma moeda. Doce engano! Uma pessoa pode não dar valor ao que se fez por ela. Ou, ainda pior, pode ter inveja, despeito. Muitas das respostas para as dores carregadas na alma  estão também no seu próprio DNA, e no DNA do outro.

 

Um animal selvagem, um carnívoro, por exemplo, tem uma natureza sanguinária. Ele é um assassino de presas e não carrega remorso por ter matado para se alimentar. No reino animal, matar sempre tem uma utilidade. E por que, então,  nos iludimos, pensando que se não fizermos mal a alguém, essa pessoa não nos fará mal? Que pensamento esquisito! Esquisito porque a traição, meu caro, pode estar na natureza do outro.

Lembro-me de um assassino. Ele matou um homem, foi preso, conquanto soltaram-no por falta de provas. Todos sabíamos do fato, porém o silêncio imperou. Talvez porque o assassinado não fosse flor que se cheirasse. Um dia,  contou da soltura sem um pingo de remorso ou arrependimento. Aquelas questões eram dele, do assassino. Muitas vezes, um assassino é como aquele animal que segue o instinto, e o instinto pode levar ao prejuízo alheio, porque é da sua natureza. A maldade, às vezes, já vem embutida no DNA de muitas pessoas.

 

Mas o perdão verdadeiro, esse também aprendemos com eles, os animais "irracionais". Minha cadela, um dia, matou minhas duas gatas. Gatas que eu amava e amo. Fiquei desolada, as gatas eram moradoras antigas da casa, consentiram que a cadela viesse, tivesse seus filhotes. Elas respeitaram a cadela e as crias. Em troca, receberam traição. Mas uma traição, entre aspas, irracional. Algo embutido no DNA daquele animal. Uma coisa da natureza que não pode ser refutada e, por isso, é digna de perdão.

E, confesso, o bicho predador era encantador. Foi nesse momento que compreendi uma das faces do verdadeiro perdão: para perdoar de verdade, é preciso amar verdadeiramente o autor do ato letal. O perdão é, de fato, um passo na evolução do ser humano. Contudo, essa compreensão não anula a dor e o vazio que podem permanecer. Com certeza, pode dar uma sensação de libertação. Talvez um dia entenda, pois está acima da minha compreensão o que chamam de "perdão de Deus". Talvez porque seja tudo objeto de sua criação e até nós humanos somos e somos também ínfimos perante a imensidão existente. 

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Muito obrigada pela sua leitura! 📚 📚 

As trilhas sonoras, também as crio.

LYGIA VICTORIA
Enviado por LYGIA VICTORIA em 09/06/2025
Alterado em 09/06/2025


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