As sondas terrestres jamais detectaram nada. Os oceanos profundos da Terra guardavam um segredo que transcendia a biologia ou a geologia conhecidas: refugiados.
Eles vieram do distante exoplaneta K2-18b, uma civilização aquática avançada em busca de um novo lar nas profundezas abissais terrestres. Seu mundo natal, outrora um paraíso aquático notavelmente similar à Terra primitiva, sucumbia a uma crescente toxicidade de origem desconhecida. Em naves silenciosas e biomiméticas, projetadas para resistir às imensas pressões e à escuridão, eles cruzaram o cosmos, guiados por dados ancestrais que apontavam para um planeta azul com vastos oceanos.
Sua chegada foi um sussurro nas profundezas. O anonimato dos abismos inexplorados da Terra ofereceu o refúgio desejado. Estabeleceram-se em intrincadas comunidades, empregando bioengenharia para criar habitats que replicavam as condições de seu lar. Observavam as correntes, a vida marinha, a superfície caótica banhada pela luz de um sol distante, aprendendo os ciclos da Terra, suas maravilhas e, inevitavelmente, suas feridas.
As correntes profundas traziam consigo a marca da atividade humana: microplásticos, químicos tóxicos, o descarte irresponsável. Inicialmente, era uma curiosidade distante, algo que seus sistemas de filtragem conseguiam processar. Mas a poluição se intensificou, atingindo concentrações alarmantes em certas áreas, afetando sua saúde, seus sistemas de suporte de vida bioengenheirados, ameaçando a própria existência de suas colônias.
O Grande Conselho de K2-18b ponderou durante anos. A paciência, cultivada em milênios de observação silenciosa, começou a se esgotar. A Terra, o santuário almejado, espelhava o destino de seu planeta natal, ironicamente, vítima de uma contaminação de origem desconhecida.
A decisão final ecoou nas profundezas: era tempo de revelar-se. Não como conquistadores, mas como um alerta, um reflexo sombrio do caminho que a humanidade parecia seguir.
As primeiras manifestações foram sutis: anomalias nos sonares de pesquisa em águas profundas, estranhos padrões de bioluminescência em áreas escuras, formações orgânicas desconhecidas crescendo em equipamentos submersos, deixando os cientistas perplexos.
Então, o contato direto se estabeleceu.
Em diferentes pontos do planeta, submersíveis encontraram estruturas cristalinas pulsando com uma luz suave e rítmica. Delas emergiram seres aquáticos de beleza etérea, corpos alongados e translúcidos, olhos grandes e expressivos carregando a sabedoria de eras incontáveis. Sua comunicação, telepática, transmitia ondas de compreensão diretamente às mentes dos exploradores atônitos.
A mensagem ressoou clara, carregada de profunda tristeza: "Nossos lares nas profundezas estão sendo envenenados por seus dejetos. A vida que buscamos preservar está ameaçada por sua negligência. Viemos em paz, buscando apenas um lar seguro. Mas se a poluição persistir, se vocês continuarem a sufocar os oceanos, não teremos escolha a não ser lutar pela nossa sobrevivência."
O mundo da superfície estremeceu. A descoberta de vida extraterrestre era monumental, mas a razão de sua aparição era uma acusação dolorosa. Reuniões de emergência entre governos se sucederam. A opinião pública oscilava entre o medo do desconhecido e a vergonha da verdade exposta.
As primeiras interações foram tensas. Os habitantes de K2-18b apresentaram evidências irrefutáveis da contaminação: amostras de água das profundezas saturadas de poluentes, organismos marinhos terrestres deformados e doentes. Sua tecnologia, sutil e baseada em princípios biológicos, revelava um conhecimento profundo dos oceanos da Terra, superando a compreensão humana.
A sombra da guerra pairava. Líderes mundiais se dividiam entre a hostilidade e o apelo ao diálogo. A humanidade se confrontava com seu próprio potencial destrutivo, refletido nos olhos tristes de uma civilização alienígena.
O futuro permanecia incerto, dependendo da capacidade humana de reconhecer sua responsabilidade, de alterar seus hábitos destrutivos e de aprender a coexistir com uma nova forma de vida que buscara refúgio em seu planeta, apenas para encontrar os mesmos problemas que a haviam forçado a partir de seu lar. As lágrimas de K2-18b nas profundezas da Terra ecoavam um aviso silencioso, mas eloquente: o destino de dois mundos aquáticos estava agora irrevogavelmente entrelaçado.
Diante desta realidade inegável, e considerando que ambos, habitantes da superfície e das profundezas, compartilham o mesmo planeta, propomos formalmente um acordo de cooperação mútua. Este acordo teria como objetivo primordial a resolução da crise de poluição que ameaça a todos. Através do compartilhamento de conhecimentos, tecnologias e esforços conjuntos, podemos trabalhar para restaurar a saúde dos oceanos e, por extensão, de todo o planeta Terra. Afinal, este é o único lar que temos.
Muito obrigada por sua leitura! 📚 📚
As trilhas sonoras, também as crio.